Dcadas depois de institurem o regime de capitalizao nas aposentadorias, Chile, Colmbia, Mxico e Peru se depararam com pelo menos um grande problema: benefcios demasiadamente baixos ou cobertura restrita, que exclui parte dos idosos (Camilla Veras Mota)
Pelo menos quatro pases da Amrica Latina que tm sistemas de aposentadoria com regimes de capitalizao - Chile, Colmbia, Mxico e Peru - tm revisado seus modelos nos ltimos anos e, em alguns casos, proposto mudanas na legislao previdenciria.
Dcadas depois de realizarem grandes reformas que, via de regra, substituram sistemas pblicos de Previdncia por outros total ou parcialmente privatizados, cada um deles se deparou com pelo menos um grande problema: ou o valor dos benefcios recebidos pelos aposentados era muito baixo ou o alcance do sistema se revelou muito , o que deixaria um percentual significativo da populao sem aposentadoria no futuro.
Ao contrrio de boa parte dos vizinhos, o Brasil ainda segue um modelo de repartio na Previdncia, que istrada exclusivamente pelo governo e na qual as contribuies de quem est na ativa pagam os benefcios de quem est aposentado.
No regime de capitalizao, cada trabalhador faz sua prpria poupana em contas individuais que, de forma geral, so geridas por entidades privadas.
O ministro da Economia, Paulo Guedes, repetiu durante a campanha eleitoral sua inteno de instituir esse modelo no Brasil. No incio de janeiro, ele declarou que o regime de capitalizao seria para "geraes futuras" de trabalhadores brasileiros, sem dar detalhes. A equipe econmica deve encaminhar uma proposta de reforma da Previdncia ao Congresso neste ms.
No caso do Chile, primeiro pas do continente a adotar um regime de capitalizao, em 1983, o governo props em outubro do ano ado mudanas pontuais na legislao para tentar elevar gradualmente o nvel baixo das aposentadorias.
O Peru, que fez sua reforma em 1992 e enfrenta problema parecido, tem discutido medidas semelhantes s estudadas no Chile, entre elas aumentar as alquotas de contribuio.
Na Colmbia, a questo a baixa cobertura do sistema de capitalizao. Diante de uma participao expressiva do emprego informal no mercado de trabalho, muita gente sequer contribui para o sistema de Previdncia e corre o risco de ficar sem aposentadoria.
A equipe do presidente Ivan Duque anunciou em 2018 que enviaria ao Legislativo uma proposta reforma, mas ainda no a apresentou.
No Mxico, a situao parecida. Em 2018, antes da posse do presidente Andrs Manuel Lpez Obrador, que ocorreu em dezembro, o secretrio da Fazenda e Crdito Pblico, Carlos Urza, declarou que o governo trabalharia em uma mudana nos sistemas de aposentadoria para tentar corrigir as falhas.
A proposta de reforma viria "em trs ou quatro anos".
NO CHILE, MAIORIA DOS APOSENTADOS RECEBE MENOS DE UM SALRIO MNIMO
Por ter sido o primeiro pas do continente a fazer a transio de um sistema pblico de Previdncia para um totalmente privatizado, o Chile j tem hoje uma gerao de aposentados pelas regras institudas pela reforma - feita em 1983, durante a ditadura de Augusto Pinochet.
O principal problema do modelo chileno baixo valor dos benefcios. De acordo com Felipe Bruno, lder de Previdncia da consultoria Mercer no Brasil, nove em cada dez aposentados no pas recebe o equivalente a menos de 60% de um salrio mnimo, que hoje de cerca de US$ 450.
A principal razo para isso, segundo Guillermo Larrin, professor da Universidade do Chile, o fato de que as contribuies feitas pelos trabalhadores - hoje de 10% do salrio - no so suficientes para garantir uma renda que satisfaa as necessidades bsicas dos chilenos aposentados.
Apenas para efeito de comparao - j que o modelo brasileiro essencialmente diferente do que vigora no vizinho -, a contribuio previdenciria paga pelos empregados no Brasil vai de 8% a 11% da remunerao, mas as empresas recolhem para o INSS o equivalente a 20% do salrio do funcionrio.
"Quando a reforma foi feita no Chile, existia um otimismo irracional a respeito da capacidade de poupana do sistema", diz o economista.
Alm da questo da contribuio em si, as oscilaes constantes da economia chilena - que, como a maioria dos pases do continente, alterna ciclos de crescimento com perodos de crise - prejudicaram a rentabilidade dos fundos de penso.
Ao contrrio do sistema pblico, no sistema de contas individuais as taxas de juros so extremamente importantes, porque determinam quanto o que foi poupado vai valer no futuro e, portanto, o nvel de renda dos aposentados.
Felipe Bruno, da Mercer, ressalta ainda o fato de que h pouca concorrncia entre gestoras de fundos de penso no pas, que cobram taxas de istrao muitas vezes elevadas e que muitas vezes so pouco transparentes.
A NOVA REFORMA DA PREVIDNCIA NO CHILE
Em outubro de 2018, o presidente Sebastin Piera encaminhou ao Congresso uma proposta de reforma que prev um aumento gradual da alquota previdenciria de 10% para 14%. A diferena seria paga pelas empresas, que at ento s contribuam em casos de profisses insalubres.
"Sabemos que hoje as aposentadorias so muito baixas e inferiores s expectativas de nossos idosos", disse ele durante o pronunciamento.
As medidas, que ainda precisam ser aprovadas pelo Legislativo chileno, preveem tambm um reforo do "pilar solidrio" da Previdncia, que paga benefcios assistenciais queles em situao de vulnerabilidade social. A previso que esse tipo de gasto, pago pelo governo, cresa de 0,8% para 1,12% do PIB (Produto Interno Bruto).
Em comunicado veiculado em rede nacional, Piera ressaltou que, dos 2,8 milhes de aposentados no Chile, mais da metade - 1,5 milho - necessitam de auxlio do pilar solidrio. Ou seja, recebem ou a chamada Pensin Bsica Solidria de Vejez (PBSV), que varia entre US$ 180 e US$ 215, ou o Aporte Previsional Solidario de Vejez (APSV), subsdio pago a quem ganha menos de US$ 470, para complementar a renda.
Larrin conta que o PBSV e o APSV foram criados em uma reforma recente, de 2008, que introduziu uma srie de medidas de preveno da pobreza na terceira idade.
Do total de pessoas que dependem do pilar solidrio, 62% so mulheres - que em geral tm uma participao mais intermitente no mercado de trabalho, muitas vezes interrompida pela maternidade.
Mesmo tendo servido como inspirao para o resto da regio, nem o Chile est livre da necessidade de reformar o prprio regime de previdncia
Constantin Jancs, economista do Bradesco, no relatrio Sistemas de Previdncia Social na Amrica Latina, enviado a clientes em dezembro
No Peru, que enfrenta problema bastante semelhante ao do Chile, o sistema de capitalizao existe em paralelo ao sistema de repartio - o trabalhador pode escolher se contribui com 13% da renda bruta para Sistema Nacional de Pensiones (SNP) ou com 10% do salrio para o Sistema Privado de Pensiones (SPP).
Os empregadores no precisam contribuir, a no ser que seus funcionrios sejam pescadores, trabalhadores da construo e mineradores.
O pas instituiu em 2017 uma Comisin de Proteccin Social (S), vinculada ao Ministrio da Fazenda, para fazer um diagnstico do sistema e propor mudanas e estuda instituir alguma alquota de contribuio para as empresas na tentativa de elevar o valor mdio dos benefcios pagos aos aposentados.
NO MXICO E NA COLMBIA, 7 EM CADA 10 TRABALHADORES CORRE O RISCO DE FICAR SEM APOSENTADORIA
O sistema de aposentadorias mexicano est entre os piores no ranking feito pela consultoria Mercer. Entre 34 pases, ocupa a 32 posio - atrs apenas de ndia e Argentina.
A avaliao leva em considerao trs parmetros: adequao (o quanto os benefcios conseguem garantir um nvel de renda satisfatrio aos idosos), sustentabilidade (se os gastos do governo com os respectivos sistemas cabem no oramento pblico) e integridade (se os sistemas tm governana, capilaridade).
O Brasil est no 21 lugar do ranking de 2018, com boa pontuao no quesito adequao e uma das piores notas em sustentabilidade.
O principal problema do Mxico, para o pesquisador do Instituto de Investigaciones Econmicas da Universidade Nacional Autnoma de Mxico (IIEc-UNAM) Gabriel Badillo, a baixa taxa de cobertura do sistema previdencirio, que de pouco mais de 30%.
Grosso modo, isso significa que, a cada dez mexicanos ocupados, cerca de trs apenas recolhem contribuio mensal para a Previdncia.
Para Badillo, o fato de que o mercado de trabalho no Mxico marcado pela informalidade - cerca de 60% daqueles empregados no tm carteira assinada - no teria sido levado em considerao na reforma feita em 1997, que instituiu o regime de capitalizao.
Para aqueles que no recolhem a contribuio mensal e que correm o risco de ficar sem aposentadoria no futuro, a alternativa seriam os benefcios assistencialistas e as chamadas aposentadorias no contributivas, criadas pelo governo na tentativa de evitar situaes de indigncia na terceira idade.
O Programa Pensiones para Adultos Mayores (PAM), por exemplo, foi criado em 2013 e paga cerca US$ 50 por ms para idosos sem aposentadoria com mais de 65 anos.
No ltimo dia 13 de janeiro, o presidente Andrs Manuel Lopez Obrador, recm-empossado, lanou o Programa de Pensin para el Bienestar de las Personas Adultas Mayores com o intuito de aumentar o valor dos benefcios pagos aos idosos.
Aumentar o percentual de contribuintes tambm desejvel do ponto de vista das finanas do governo, para reduzir as presses fiscais que acabam avanando pelo lado da rede de proteo social, acrescenta Jancs, do Bradesco, no relatrio sobre os sistemas de Previdncia da Amrica Latina.
Sem um nvel elevado de participao dos trabalhadores, os governos correm o risco de gastar cada vez mais com benefcios no contributivos para idosos e com aposentadorias mnimas.
O sistema de repartio gerido pelo Instituto Mexicano de Seguridade Social (IMSS) ainda convive com o sistema de capitalizao individual, cuja adeso obrigatria apenas para aqueles que entraram no mercado de trabalho depois de 1997.
Na Colmbia, que instituiu o sistema de capitalizao em 1993, o regime tambm hbrido, com a diferena de que o segurado pode converter seu plano de seguridade social em plano de contribuio individual - e vice-versa - a cada cinco anos, at 10 anos antes da aposentadoria.
Para Herv Boulhol, economista-snior da diretoria de Emprego, Trabalho e Assuntos Sociais da OCDE (Organizao para a Cooperao e Desenvolvimento Econmico), essa caracterstica mais um desafio do modelo colombiano.
O fato de o contribuinte poder ir e voltar cria um risco fiscal para o governo, que poderia eventualmente ter que lidar com um aumento das despesas com aposentadorias caso houvesse uma grande migrao para o sistema pblico, por exemplo.
A Fedesarrollo, organizao sem fins lucrativos dedicada pesquisa de temas de polticas econmica e social, afirma que hoje apenas 35% dos trabalhadores recolhem algum tipo de contribuio previdenciria e que, sem reformas, em 2050 apenas 17% dos colombianos com mais de 60 anos receberiam aposentadorias.
O presidente Ivan Duque, que assumiu o cargo em agosto do ano ado, j declarou que encaminhar ao Congresso uma proposta para reformar o sistema - sem, entretanto, fixar um prazo.
Alm da alta taxa de informalidade e as alquotas de contribuio baixas, outro problema comum nos sistemas de capitalizao na Amrica Latina o fato de que a poupana feita pelos trabalhadores tem que financiar perodos cada vez maiores, devido ao aumento da expectativa de vida.
"No Chile, por exemplo, uma mulher que se aposenta aos 60 anos de idade vive em mdia at os 91. Com o que pouca tem de financiar em mdia 31 anos de aposentadoria. Para ter uma renda mais alta, ela vai precisar poupar mais ou parar de trabalhar mais tarde", diz Mariano Bosch, especialista da Diviso de Mercado de Trabalho do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e coautor de Presente e Futuro das aposentadorias na Amrica Latina e Caribe.
QUAL A SOLUO?
Bruno, da Mercer, ressalta que Holanda e Dinamarca, os mais bem colocados no ndice Global de Sistemas Previdencirios da consultoria, tm sistemas de aposentadoria que no so nem totalmente pblicos nem totalmente privados.
Eles tm um pilar de repartio simples - que paga aposentadorias modestas a todos os seus segurados, mas que tem um grande alcance na populao idosa - e, sobre ele, um pilar de capitalizao, que serve como uma espcie de renda complementar para aumentar a aposentadoria daqueles com maior capacidade contributiva.
A ideia geral que, quem recebe maiores salrios, poupa um pouquinho mais no brao privado do sistema para ter benefcios maiores durante a aposentadoria.
Em ambos os pases, o sistema de proteo social funciona como "pilar zero", com pagamento de benefcios assistenciais para evitar situaes de extrema pobreza na terceira idade.
"Esse pilar de solidariedade imprescindvel a qualquer sistema de aposentadoria, especialmente aos pases em que o nvel de informalidade elevado", acrescenta Boulhol, da OCDE.
Boulhol e Mariano, do BID, ponderam que no h uma frmula que sirva para todos os pases e que um bom sistema de aposentadoria depende de seus parmetros - idade de aposentadoria, alquotas de contribuio, nvel dos benefcios.
Ambos afirmam, ainda, que o sistema brasileiro da maneira como est estruturado hoje tampouco sustentvel, j que tem um peso excessivamente alto nas contas do governo - maior do que o observado entre os vizinhos. (Fonte: UOL)
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